Entrevista por Richard Romancini, publicado originalmente na revista MATRIZes.
Diretor do Centre for Digital Culture do King’s College London, onde trabalha como professor sênior em Cultura e Sociedade Digital, o sociólogo e teórico político italiano Paolo Gerbaudo possui doutorado em Mídia e Comunicação pelo Goldsmiths College, com a orientação de Nicky Couldry. Além da carreira acadêmica, também atuou como jornalista, cobrindo movimentos sociais, política e questões ambientais. Seus interesses de pesquisa relacionam-se ao papel das mídias sociais no ativismo contemporâneo; à transformação dos partidos políticos; ao populismo; à comunicação política, particularmente no ambiente digital; e às subculturas juvenis. Conhecedor e interessado na realidade brasileira, abordada em um de seus livros, The mask and the flag (Gerbaudo, 2017), no qual realiza uma análise global da onda de protestos (2011–2016) do chamado movimento das praças — que corresponde, no Brasil, às mobilizações de junho de 2013 –, Gerbaudo esteve novamente no país, em São Paulo, no início de março de 2020, sendo conferencista do evento “Living on the edge: studying conviviality-inequality in uncertain times”, promovido pelo Maria Sibylla Merian Centre Conviviality-Inequality in Latin America (Mecila). Nesta ocasião, falou sobre “A retórica do controle e o novo senso comum da era populista”, temática que se situa no âmbito de suas preocupações mais recentes, abordada em livro que está concluindo.
Gerbaudo publicou até o momento, além de diversos artigos, três livros –Tweets and streets (2012), The mask and the flag (2017) e The digital party (2019),nos quais as conexões entre as tecnologias, particularmente digitais, e os processos de mobilização social e políticos, são analisados sob diferentes ângulos. Estes e outros trabalhos do autor são discutidos nesta entrevista para MATRIZes. Vale notar que os três livros mencionados estão sendo traduzidos para o português, e serão publicados, conforme a ordem cronológica original, pela editora paulista Funilaria, começando com Tweets and streets (que recebeu o título de Redes e ruas: mídias sociais e ativismo contemporâneo), em fevereiro de 2021.
MATRIZes: Gostaria de começar a entrevista com uma pergunta provocativa: o fato de Manuel Castells, um entusiasta das mobilizações com o uso das redes digitais, ter assumido o Ministério das Universidades, na Espanha, justamente na cota do Podemos, tem, para você, algum valor simbólico quanto ao tema de suas investigações?
Paolo Gerbaudo: Sim, acho que a indicação de Manuel Castells como ministro da Educação Universitária na Espanha é uma ótima notícia para alguns de nós, porque ele é um cientista social muito famoso e respeitado e, por muito tempo, trabalhou em diversas questões que são bastante relevantes para cientistas sociais como eu; principalmente o papel dos movimentos sociais, sua transformação ao longo do tempo, a partir dos anos 1980, e, obviamente, a sociedade em rede, que é o tema mais famoso desenvolvido por ele em seus estudos, na trilogia da sociedade da informação e outros trabalhos. Ele tem sido uma figura muito importante para os Indignados e para o Podemos, sendo de certa forma um sociólogo que explicou o que eram esses movimentos, a ação tecnológica. Portanto creio que é, de certa forma, algo ótimo para ele, mas também principalmente para o movimento coletivo na Espanha e em todo o mundo. Ele é uma figura intelectual relevante e agora recebeu uma responsabilidade tão importante, e as primeiras coisas que ele já fez como ministro estão trazendo uma mudança muito positiva ao setor educacional espanhol, com bolsas de estudo para estudantes, com mais fundos para pesquisa. Então, sim, realmente saúdo sua indicação e acho que ele fará um ótimo trabalho como ministro da Educação na Espanha.
Redes e Ruas: mídias sociais e ativismo contemporâneo
Escrito no calor do momento das manifestações ocorridas no ciclo de protestos dos anos 2010, a partir da observação direta do autor, este livro busca entender como as tecnologias digitais de informação e comunicação, especialmente as redes sociais, influenciaram as práticas de ação coletiva de movimentos e organizações sociais, ativistas e indivíduos conectados
em rede. Buscando escapar do determinismo tecnológico que muitas vezes impera em análises deste tipo, seja pelo tecno-otimismo ou pelo tecno-pessimismo, Paolo Gerbaudo olha atentamente para as práticas e ações comunicativas que se desenrolaram nas redes e nas ruas, indo na direção contrária daqueles que enxergaram nesse ciclo de protestos apenas manifestações espontâneas, construídas a partir de práticas horizontais e sem liderança. Formado politicamente pelos ideais colaborativos do movimento altermundista, o pesquisador italiano contribui com o debate sobre ações coletivas digitalmente mediadas ao identificar novos tipos de lideranças contemporâneas.
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